Sortegel reforça negócio da castanha e diversifica produção

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A Sortegel, a maior empresa de transformação de castanha em Portugal e uma das maiores da Europa, está em plena fase de laboração. A colheita arrancou em finais de setembro, mas este ano o fruto do outono ressentiu-se da escassez de chuva e das elevadas temperaturas. Há uma quebra acentuada na produção e a qualidade não é a desejável.

A empresa transmontana está numa fase de redesenho da estratégia de negócio, consciente que a castanha vale mais de 90% das suas vendas. A Sortegel quer diversificar as áreas de negócio, atendendo às incertezas que pairam sobre o futuro dos castanheiros e também à sazonalidade da castanha. Em paralelo, está a apostar no lançamento de novos produtos de castanha nos mercados interno e externo, acrescentando valor. Para breve, estão previstas outras novidades.

O futuro da unidade transmontana está agora nas mãos de um empresário da região Norte. Em 2015, comprou a Geosil, que detém a Sortegel, à Sociedade Lusa de Negócios, após o colapso do BPN. A empresa emprega em permanência mais de 60 pessoas, e outras tantas entre outubro e março – a época da colheita e congelamento da castanha –, e responde por um volume de negócios anual da ordem dos 20 a 25 milhões de euros, uma oscilação que acompanha o ritmo das campanhas.

Sortegel reforça negócio da castanha e diversifica produção

Vasco Veiga, administrador da Sortegel

Produção cai 25% em 2017

A Sortegel está a braços com uma colheita que regista uma quebra de 25% na produção e apresenta um produto de fraca qualidade. “A castanha cresceu cheia de fungos, com dificuldades de conservação e apresenta alterações estruturais ao nível do sabor e da cor”, explica Vasco Veiga, administrador da empresa. Este responsável não gosta de falar em alterações climáticas para justificar estas variações. “Não sabemos se este clima veio para ficar, sabemos é que se registaram altas temperaturas e uma seca prolongada. A castanha sofreu com esse clima, desidratou e não tem qualidade”, diz.

A colheita vale mais de 95% das necessidades de abastecimento da empresa, que apenas tem uma área própria de 250 hectares de castanheiros. Em anos sem atipicidades, chegam a comprar 8 a 10 mil toneladas de castanha. Mas este outono há produtores que nem estão a fazer a apanha, por o fruto se apresentar de má qualidade e de pequena dimensão. Saliente-se que a castanha para consumo em fresco deve ter um diâmetro de 30 milímetros. Calibres de menor dimensão destinam-se à indústria.

Sortegel reforça negócio da castanha e diversifica produção

A riqueza da região está assim ameaçada. Segundo Vasco Veiga, a Sortegel paga entre um a 2,5 euros por quilo aos produtores, dependendo da qualidade. Na campanha de 2016, colheita de qualidade excepcional, chegou a pagar 3 euros por quilo. Nesse ano, a Sortegel comprou nove mil toneladas. Para muitos produtores, a castanha equivale a um complemento do rendimento, muito aguardado por estas alturas do ano. Há zonas de produção em que a quebra aproxima-se dos 40%.

Sortegel reforça negócio da castanha e diversifica produção

De Sortes para a Europa

A Sortegel, instalada na freguesia brigantina de Sortes, trabalha essencialmente para exportação. Nesta época do ano e com a campanha em pleno, a empresa define cerca de 30% da produção estimada para a venda a fresco, metade em Portugal e a outra metade com destino a vários países da Europa.

Os 70% de produção remanescente são congelados e é neste processo que reside a grande área de negócio da Sortegel. Todos os anos são congeladas entre seis a sete mil toneladas de castanha. O fruto é sujeito a descasque e despelagem por um processo industrial de calor e é congelado. De acordo com Vasco Veiga, os mercados externos adquirem 70% da castanha congelada, sendo os mais significativos França, Itália, Espanha, Alemanha e Bélgica.

A Sortegel vende à indústria transformadora europeia a castanha congelada a granel, em sacos de 25 quilos. Vasco Veiga olha para estes compradores europeus “como parceiros e não como concorrentes” e não quer “entrar em concorrência com os clientes”. O objectivo é “dar-lhes boas condições para serem competitivos na área da transformação”, sublinha. Já nos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), a Sortegel vende em sacos de quilo para consumo final.

Sortegel reforça negócio da castanha e diversifica produção

Em Portugal, a empresa tem contratos com as grandes distribuidoras, e vende sob marca branca em sacos de um quilo e meio quilo. Ostentando a marca Sortegel encontra-se a castanha congelada em supermercados como o El Corte Inglés, mercearias e outros pequenos estabelecimentos comerciais. Vasco Veiga salienta que 80% do mercado da castanha congelada em Portugal é da Sortegel.

No ano passado, a empresa apostou numa nova forma de comercialização da castanha, mas apenas para Portugal, Angola e Moçambique. São embalagens de 500 gramas e de um quilo de castanha pré-cozinhada e conservada em vácuo sob marca Sortegel. Vasco Veiga admite que a Sortegel irá crescer através de novas formas de comercialização da castanha, mas apenas nos mercados onde não estão os principais clientes, ou seja, fora da Europa. As novas apostas estão pensadas para 2018/19, até porque a qualidade e quantidade da actual campanha não permite outros voos. Uma das ideias é produzir cremes de castanha.

Frutos congelados e secos

Para combater a sazonalidade da castanha, a Sortegel também congela e comercializa outros frutos. Em março, começa a receber os morangos e em maio está já com a cereja, a amora silvestre, os figos, mirtilos e framboesas. Todos estes frutos são adquiridos a produtores nacionais, espalhados pelo Alentejo e Ribatejo.

A Sortegel faz a lavagem, a limpeza, o congelamento e o embalamento de cerca de mil toneladas de frutos por ano. Estes produtos destinam-se essencialmente a países europeus e permitem cobrir os custos fixos da unidade. No próximo ano, a empresa equaciona avançar com a comercialização de amêndoa, noz e azeite. São projectos em estudo e que deverão passar pela compra dos frutos e posterior venda. Jorge Moreira, administrador com o pelouro da gestão, não quer dar muitos pormenores, mas adianta que no azeite estão a projectar comercializar um produto ‘premium’.

castanha Sortegel - Vida Rural

Certo é que a unidade já está a receber novos investimentos. O plano prevê a aplicação de três milhões de euros até ao final do ano para aumentar e melhorar a produção e, em simultâneo, reduzir custos. Segundo Vasco Veiga, estão equacionadas novas câmaras frigoríficas, túneis de esterilização e congelação, máquinas de escolha óptica e de embalar. Entretanto, já avançaram com um ‘re-styling’ da unidade industrial. Quando arrancarem para a produção de cremes à base de castanha terão também de fazer ajustamentos fabris.

Defender o castanheiro

A Geosil, empresa que detém a 100% a Sortegel, é proprietária de 250 hectares de souto biológico na região de Bragança e tem o objectivo de aumentar a área de castanheiros. De acordo com Vasco Veiga, há uma área florestal da Geosil que será reconvertida para souto. São 70 a 80 hectares que deverão ser plantados nos próximos dois anos. Em viveiro, a empresa tem já 20 mil árvores.

O alargamento da área do souto é uma necessidade para quem tem na castanha a principal matéria-prima. O castanheiro demora 10 anos a produzir fruto e só entre os 15/20 anos atinge a velocidade cruzeiro. Nesta fase, um hectare pode produzir três toneladas de castanha. Como frisa Vasco Veiga, estes não são “projectos para amanhã, são projectos de fundo”. A árvore tem um tempo de vida útil superior a 100 anos, não sendo difícil encontrar castanheiros com 200 ou 300 anos.

Mas há um conjunto de dúvidas sobre o futuro dos castanheiros. Vasco Veiga salienta que os produtores locais já têm consciência do valor da castanha e passaram a assumir cuidados com as suas árvores. Ainda assim, as doenças aparecem e algumas de difícil resolução. Os soutos debatem-se com a doença da tinta e com o cancro (ambos fungos) e a vespa das galhas do castanheiro, um insecto originário da China. As primeiras duas doenças exigem cuidados, mas têm tratamento. Há ainda a praga do bichado do castanheiro, mas é a vespa das galhas o quebra-cabeças dos produtores. Este insecto prejudica o desenvolvimento vegetativo do castanheiro, diminuindo o crescimento dos ramos e a formação de frutos. A doença, que pode conduzir à morte da árvore, provocou quebras de 80% na produção de castanha em Itália. O parasita ‘Torymus sinensis’ pode ser utilizado para o controlo biológico desta praga, mas os resultados são demorados.

Sortegel reforça negócio da castanha e diversifica produção

Vasco Veiga está seriamente preocupado com a disseminação da doença da vespa das galhas nos castanhais. “Estamos há espera para ver as consequências que terá no castanheiro”, diz, recordando que se o clima se mantiver quente e seco soma-se mais uma ameaça à sustentabilidade destas matas.

Produção biológica

A Quinta Vila Boa de Arufe é uma das maiores quintas da Europa de castanheiros. Propriedade da Geosil, que detém a Sortegel, a quinta tem na produção de castanha biológica a sua actividade principal. Por esta altura, o castanhal enche-se de grupos para a apanha manual da castanha das variedades longal (a que tem mais presença), judia e martaínha. Este ano, estão pouco mais de 20 pessoas na apanha, mas em 2016 contabilizaram-se 60. Embora a Sortegel tenha meios mecânicos de apanha, há locais onde as máquinas não chegam e a mão humana é mais eficaz. A apanha mecânica exige um compasso de 10 metros por 10 metros.

A apanha da castanha prolonga-se essencialmente pelos meses de outubro e novembro e é um trabalho diário. Só quando o ouriço cai da árvore, normalmente com três frutos, é que é a altura ideal para a apanha. Esta particularidade obriga a passar diversas vezes pelos mesmos castanheiros de forma a potenciar a colheita. Vasco Veiga realça que neste negócio “o maior custo é a apanha que, entre mão-de-obra e gasóleo, pode valer 40% do preço de venda.

A produção biológica é garantida pela pastagem de mais de 300 ovelhas da raça churra galega de Trás-os Montes, não havendo lugar a mobilizações do solo, e a adubação é feita à base de matéria orgânica. Já os consumos de água estão indexados aos castanheiros mais jovens. Como adianta Bruno Veiga, responsável pela gestão da quinta, são gastos entre 8 a 10 mil litros por dia nesses castanheiros durante o período de calor, água que provém das duas barragens que existem na propriedade. Apesar de não faltar água nas terras de Vila Boa de Arufe, este ano também não há quase cogumelos dada a falta de humidade no solo.

A quinta tem uma casa brasonada, estando em estudo a sua recuperação para atividade turística.

A caminho dos 30

A Sortegel surgiu em 1988, por iniciativa de vários produtores e comerciantes de castanha da região da Terra Fria. Por desentendimentos vários dos intervenientes iniciais, o projecto acabou por ser adquirido por Manuel Prego. É pelas mãos deste empresário que se inicia a laboração em 1991 e se dá o desenvolvimento da empresa.

Com a sua morte e o desinteresse da família, a Sortegel passa por um período difícil. Em 2002, a SLN compra a empresa que registava prejuízos sucessivos e, dada a pequena dimensão da unidade, decide realizar um investimento de dez milhões de euros. Vasco Veiga conta que a Sortegel passou de uma capacidade de 800 quilos para cinco toneladas/hora na área da congelação. O projecto terminou em 2005 e a Sortegel ficou uma nova empresa.

No entretanto, dá-se o caso BPN, que acaba por arrastar todas as empresas que directa ou indirectamente lhe estavam ligadas. A empresa não parou de laborar e manteve a actividade rentável. Quase 30 anos depois, a Sortegel foi o primeiro investimento na área agro-industrial de um empresário do Norte, que prefere o anonimato e que, segundo se pode apurar, não ficará por aqui.

A CULTURA DA CASTANHA NA SORTEGEL

Produtores: Mais de mil produtores vendem anualmente castanha à Sortegel;

Área de plantação: A Sortegel tem 250 hectares de castanheiros biológicos;

Plantação: entre novembro e até março, em solos leves e frescos;

Amplitudes térmicas: Na altura da plantação não são importantes; Na floração deve haver calor e vento leve e temperaturas nunca abaixo dos 12ª; A fecundação pede temperaturas acima dos 12º.

Produtividade em velocidade cruzeiro: 3 toneladas por hectare;

Escoamento: Castanha fresca: 50% mercado nacional, 50% mercado europeu. Castanha congelada: 30% mercado nacional, 70% mercados externos;

Preço: 1 a 2,5 euros por quilo é quanto paga a Sortegel; Pode atingir os 3 euros em campanhas de fraca qualidade.

Compras anuais: 8 a 10 mil toneladas;

Necessidades hídricas: a falta de chuva começa a obrigar a regar o castanheiro; castanheiros jovens devem ser regados diariamente nos meses de calor (entre 5 a 10 litros por árvore);

Pragas e doenças: doença da tinta, cancro, bichado e vespa das galhas;

Mão-de-obra: Exigência de mão-de-obra na colheita. Pode representar 40% do preço de venda.

Colheita: outubro e novembro, quando os ouriços caem.

VALOR NUTRICIONAL DA CASTANHA

A castanha é um produto nacional com fortes tradições no País. O fruto do castanheiro tem importantes valores nutricionais, a saber:

Proteína e aminoácidos: Teor de proteína reduzido, mas rica em aminoácidos essenciais como arginina, valina, isoleucina e fenilalamina;

Ácidos gordos insaturados: Baixo teor de gordura, isenta de colesterol e rica em ácidos oleico, linolénico e linoleico;

Amido: Rica em hidratos de carbono facilmente digestíveis, principalmente sob a forma de amido. Isenta de glúten;

Fibra: Teor elevado;

Sais minerais: Elevado teor de sais minerais P (Fósforo) e K (Potássio);

Fitoquímicos: Contém ácidos gálico e elágico;

Vitaminas: Destacam-se as vitaminas C, B e pró-vitamina A.

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