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Está a crescer o cultivo do sésamo no Brasil, especialmente como alternativa para a “segunda colheita”, popularmente chamada de “safrinha”. Neste país tropical, após a colheita da cultura principal de soja ou milho (que ocorre no verão do hemisfério sul), é feita de seguida uma rotação de culturas para o plantio de inverno. É nessa ‘janela’ que está a ganhar importância o sésamo, que vem garantindo maior rendimento aos agricultores brasileiros. O estado do Mato Grosso (MT) é um desses locais onde a segunda cultura está a ser dominada por esta herbácea, principalmente devido às condições climáticas favoráveis para a cultura.
De acordo com o produtor rural e proprietário da LC Sementes, Leandro Lodea, o sésamo surgiu como uma medida de emergência, já que o cultivo da safrinha de milho não era possível devido à falta de água: “Na nossa fazenda em Nova Ubiratã (MT) tínhamos um período de chuvas bastante curto e, por não conseguir fazer a safrinha de milho adequada, comecei a procurar alternativas, que na época passaram pelo feijão-caupi [feijão-frade]. Comecei a interessar-me pelo que chamamos de culturas alternativas, ou cultivos especiais, e fomos pesquisando”, comenta.
“Uma das culturas que comecei a pesquisar foi o sésamo, há uns cinco anos atrás. Só que, na época, não havia obtentor e não consegui ter confiança. Até que a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) me enviou sementes da variedade BRS Anahí e começámos a fazer o teste. No ano passado, a Embrapa libertou esta variedade para começarmos a multiplicar – porque na realidade eu sou multiplicador, o que aqui no Brasil chamamos de ‘sementeiro’ –, e começámos a sentir confiança no material. Por sorte do destino, foi o ‘boom’ do sésamo aqui na região! Hoje, somos a primeira sementeira a ter sésamo fiscalizado no Brasil”, completa Lodea.
Dados da Embrapa dão conta de que o município de Canarana, onde a produção de Lodea está localizada, responde sozinho por mais de 80% da produção brasileira desta cultura, com uma área plantada de 50 mil hectares nesta campanha, segundo estimativa dos produtores. Para o próximo ano, porém, há expectativa de dobrar esta área.
“Uma das cultivares que tem despertado bastante interesse dos produtores da região é a BRS Anahí, cultivar de haste única com crescimento não ramificado, com uma produtividade em torno de 1600 quilos por hectare. A coloração do grão é branca, o que promove a aceitação no mercado da panificação, mas também para exportação. A cultivar tem mostrado uma ótima adaptação em Canarana e maior produtividade em relação às demais variedades plantadas na região”, afirma a pesquisadora da Embrapa, Nair Arriel.
Lodea conta que a região “não teve uma campanha de soja muito boa”, e que o sésamo foi usado pelos agricultores para pagar as “contas atrasadas”. “A economia do município ganhou muito. Regiões que têm experiência (com menos precipitação) têm vantagem em produzir esta cultura alternativa, que não representa tanto risco e remunerou melhor do que a soja”, explica Lodea.
A Embrapa afirmou ainda que a maior parte do sésamo que é produzido no município de Canarana é destinado à exportação.
Sendo assim, diversos produtores de todo o país procuraram mais informações sobre a cultura. Alex Luviseto, gerente do departamento comercial da Agrícola Ferrari, com sede no Rio Grande do Sul, informou que no ano passado a empresa exportou mil toneladas de sésamo, e as vendas da empresa devem acompanhar o crescimento da produção. “A nossa meta para este ano é chegar a 12 mil toneladas de sésamo exportado”, revela.
“O sésamo pode ser usado tanto no mercado interno quanto no externo. Nós, particularmente, focamos na exportação. Este é o nosso segundo ano com o grão – que passa, momentaneamente, por uma boa aceitação –, mas estamos trabalhando muito para melhorar algumas coisas no campo, para que o nosso produto seja cada vez mais bem aceite fora do país”, comenta Luviseto.
Ser um percursor traz muitos desafios
De acordo com Lodea, o facto de ser um percursor na multiplicação de sementes de uma cultura pouco difundida, como é o caso do sésamo e de outras culturas especiais, tal como o feijão-frade e outras vagens, traz alguns desafios. O principal, na sua opinião, é a falta de instituições dispostas a fazerem investigação sobre o tema.
“Por ser uma cultura nova, nós não temos informações técnicas. A Embrapa está a trabalhar em material genético, mas não temos pesquisa básica, falta estudo de manejo, de irrigação, de agroquímicos – não temos sequer produtos de proteção de culturas registados. Temos uma qualidade boa, especialmente agora que estamos a selecionar cultivares puras, mas não temos o mínimo para fazer uma rastreabilidade, por enquanto. Não temos como entrar no mercado europeu”, lamenta.
A Embrapa afirma que está há mais de 25 anos a realizar investigação sobre sésamo nas áreas do melhoramento genético, manejo cultural, ecofisiologia e tecnologia de alimentos. Mas esta instituição espera que os estudos aumentem à medida que os agricultores brasileiros comecem a interessar-se mais nesta cultura.
“Estas pesquisas permitiram a elaboração deste sistema de produção em bases mais racionais de produção, possibilitando a diversificação agrícola a partir da exploração de uma cultura com excelentes potencialidades económicas, agronómicas e sociais, em virtude das suas características de tolerância à seca, facilidade de manejo e obtenção de sementes com teores de óleo superior a 50%, de elevada estabilidade química e com aplicações nas indústrias alimentícias e oleoquímica. Mas também tem potencial para a produção de energia, via biodiesel”, informa.
Mercado gigantesco surpreende positivamente
Desconhecido por grande parte da população, e até por profissionais da área, o mercado de cultivos especiais tem surpreendido positivamente os produtores de sementes, principalmente aqueles ligados ao sésamo. O presidente do Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses (Ibrafe), Marcelo Lüders, avalia que este é um bom momento para as culturas especiais (pipoca, amendoim e sésamo) e para as vagens.
“Os produtores necessitam de culturas alternativas ao milho e à soja. Há uma procura mundial crescente para esses produtos. O Brasil mal começou a oferecer e já começa a aparecer procura de outros países por esses produtos. O sésamo vai continuar com uma procura crescente. O óleo, bem como outros alimentos elaborados a partir dele, não representam um mercado pequeno: é um mercado de alto valor acrescentado e com procura, seja para a África, Ásia ou mundo árabe. Nós entendemos que é um produto pelo qual vale a pena os produtores ‘saírem da sua zona de conforto’ e começarem a aprender a produzir. Assim como a investigação, que deve oferecer novas soluções e aprender junto dos produtores. Esse esforço vale a pena. É estar no lugar certo na hora certa”, defende.
Para complementar essa informação, Lodea lembra o potencial de exportação e o aumento do consumo deste tipo de alimentos também no Brasil. E conta que, no início da produção, não era possível perceber quão importante e lucrativo pode ser o investimento fora das culturas tradicionais. Mas isso desde que sejam bem administrados os recursos por parte do produtor e também das empresas de investigação, já que existem alguns problemas pontuais que, segundo o especialista, podem ser resolvidos em breve.
“Quando iniciámos a produção não tínhamos noção do tamanho do mercado, que é gigantesco, e temos o potencial. O consumo mundial chega a mais de três milhões de toneladas em termos anuais. Havia um mercado a ser explorado em que nós não estávamos a participar. Existem três desafios atualmente: a parte dos herbicidas, da mecanização da colheita e do tamanho da semente, que ainda é muito pequena”, completa.
UM GRÃO ALTAMENTE NUTRITIVO
A principal composição das sementes de sésamo, segundo a Embrapa, são as proteínas e os lípidos, sendo que as mesmas contêm entre 17% e 32% de proteínas sobre matéria seca. Além disso, o teor de óleo varia de 41% a 65% e é rico em substâncias bioativas e imunoestimulantes, como a arginina, a metionina, a cistina e a leucina, e ainda em sais minerais, como cálcio, ferro, fósforo, potássio, magnésio, zinco e selénio, sendo também encontradas vitaminas do complexo B e niacina.
Essas características benéficas à saúde fazem com que o sésamo seja bastante utilizado em produtos integrais, como pães e biscoitos. “É um alimento extremamente nutritivo, fonte de proteínas, vitaminas, sais minerais, antioxidantes e imunoestimulantes, entre outros. Além dessas qualidades, ainda tem um baixo custo de produção e aquisição, podendo ser inserido na agricultura familiar, na geração de emprego e rendimento e introduzido na merenda escolar em produtos nutritivos de qualidade”, diz a Embrapa.
“O facto de ser um alimento composto de altos teores de ácidos gordos nobres e proteínas de fácil digestão, faz com que tenha propriedades funcionais preventivas para manutenção de uma saúde adequada. Normalmente, alimentos ricos em nutrientes, tanto para alimentação humana como animal, são de alto custo e nem sempre são tão completos como o sésamo”, completa a informação.
Artigo publicado na revista Vida Rural em outubro 2019.
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Fonte: Vida Rural