Bruno Cardoso, presidente da direção da InovTerra – Associação para o Desenvolvimento Local, em entrevista ao suplemento Pequenos Frutos, fala do projeto SambucusValor, do qual as revistas AGROTEC, TecnoAlimentar e o Portal Agronegócios são parceiros.
Entrevista: Ana Clara
Pequenos Frutos – Gostava de começar pelo projeto SambucusValor – que tem como objetivo o desenvolvimento de produtos alimentares de valor acrescentado a partir do sabugueiro. Qual a importância do projeto e o que se pretende alcançar?
Bruno Cardoso – O Sambucusvalor é um projeto financiado pelo FEADER e pelo Estado Português, no âmbito da ação 1.1 «Grupos Operacionais», integrada na Medida1. «Inovação» do PDR2020. É, em primeiro lugar, um encontro de vontades de várias organizações, as melhores nas áreas que atuam, que se uniram numa parceria que visa estudar a riqueza do sabugueiro. Para o efeito, as entidades escolhidas para este projeto, são dotadas de meios técnicos e humanos, que vão desde a produção, gestão agrícola, comercialização, promoção nacional e internacional, investigação, entre outros. Neste momento, a cultura do sabugueiro representa cerca de um milhão de euros na sua comercialização em Portugal, produzindo cerca de 1500 toneladas de baga fresca. A Inovterra e os seus parceiros acreditam, que este valor pode aumentar em muito com este projeto. Para isso, propõe-se a estudar e a explorar o potencial do sabugueiro, quer através da criação de subprodutos, com uma pequena transformação, quer através da diversificação do mercado alvo do produto (exemplo Indústria farmacêutica), sempre tendo como prioridade a promoção da saúde e a prevenção das doenças. Para além do foco no desenvolvimento de produtos de valor acrescentado, a partir da flor e baga do sabugueiro, outro dos objetivos do projeto passa pela implementação de um centro piloto em Tarouca, dedicado à investigação do sabugueiro, que será um dos produtos/resultados finais deste projeto de quatro anos, com vista ao desenvolvimento de produtos alimentares saudáveis e ao incremento da economia local e nacional. O consórcio de trabalho (InovTerra – Associação para o Desenvolvimento Local, Universidade de Aveiro, INIAV – Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, Publindústria, Inovfood, Oldland e ACN) é perfeito para esta investigação. Tenho a plena convicção que os objetivos serão alcançados nestes quatro anos e que a cultura do sabugueiro será difundida e amplamente badalada, o suficiente, para aumentarmos o número de área/ produtores ligados à cultura, bem como, de dinamização de novas formas de valorização do produtos e subprodutos que resultam do sabugueiro.
PF – Como podemos caracterizar a cultura do Sabugueiro em Portugal atualmente, ao nível das oportunidades e constrangimentos?
BC – Neste momento em Portugal não se conhece muito sobre a cultura do sabugueiro. O sabugueiro, de acordo com a medicina tradicional, monges de Cister (séculos XII a XVII) e população em geral, era utilizado para fins culinários e terapêuticos, tendo-se perpetuado estes usos e costumes até aos nossos dias, no entanto não se conhece, por exemplo, os níveis de toxicidade da baga nas suas diversas fases de maturação, ou o seu valor nutricional. Por outro lado, a Universidade de Aveiro (UA), com recurso a investigações já comprovou a influência positiva da baga do sabugueiro no controlo da diabetes. E este projeto pretende isto mesmo, o esclarecimento, a investigação e produção de produtos, onde o sabugueiro seja o promotor da saúde. Há grandes esperanças de que a baga venha a ser mais introduzida na indústria farmacêutica. Há mais de três dezenas de produtos farmacêuticos no mercado português, que tem a baga de sabugueiro como matéria-prima. Ainda no tempo do Marquês de Pombal, a baga de sabugueiro foi uma cultura quase extinta em Portugal. Com a forte procura de vinhos do Porto na primeira metade do século XVIII, os agricultores com vinhos mais fracos utilizavam a baga de sabugueiro para dar cor e corpo e assim serem vendidos como vinho do Porto. Por isso, a legislação pombalina impôs a proibição do cultivo do sabugueiro no sentido de extinguir as adulterações dos vinhos. Esta medida quase erradicou a espécie. Hoje, existem empresas e particulares, que procuram internacionalmente vinhos feitos com baga de sabugueiro. A flor nunca foi explorada e neste momento não representa valor acrescentado para os produtores. A cultura do sabugueiro neste momento, é uma das bases da economia agrícola de cinco concelhos. Sendo que há um, que de facto sobressai aos outros, devido aos outros contarem com outras culturas alternativas. Tarouca sobressai, porque os outros acabam por ter (Tabuaço, Moimenta da Beira, Lamego e Armamar), uma forte influência da maçã e do vinho, o que não evidencia, com tanta eficácia, o sabugueiro. Apesar de Tabuaço ter freguesias em que realmente o sabugueiro é uma oportunidade para os locais, e para estes produtores aumentarem a sua área produzida, acaba por ser Tarouca, a liderar a produção e a comercialização. Obviamente que muito deste sucesso de Tarouca, se prende com a cooperativa Regiefrutas, que se encontra sediada no Concelho e comercializa a baga de sabugueiro. O sabugueiro acaba por ser uma cultura que está sempre vendida. Ou seja, nunca fica um grão de baga em Portugal. O que de alguma forma, é uma oportunidade para quem se quer iniciar ou aumentar uma cultura agrícola, que valha realmente a pena. Pode assim ter a garantia do escoamento, que normalmente é sempre o mais complexo na produção agrícola. A nível de constrangimento, muito há a descobrir sobre o sabugueiro, e das suas aplicações práticas, tanto sobre a baga, como da flor, das folhas e do caule. Há muitas aplicações do sabugueiro ainda por descobrir, e é aí, que este grupo operacional, pretende conhecer melhor as características destes produtos, para conseguir que com uma transformação mínima, aumente a margem do produto ao produtor e que a mesma fique no país.
Cultura rentável
PF – Quais as mais valias a nível económico da cultura e da rentabilidade do sabugueiro?
BC – O facto de se saber à partida que vai estar escoado, de existir a garantia de que o produto se vende, já é por si só uma garantia a nível económico. Neste momento, o grande comercializador da paga de sabugueiro é a cooperativa RegieFrutas. Que pagam e não pagam aos agricultores, entre 30 a 60 dias, após a receção da baga na cooperativa. O que de alguma forma, contrasta com os outros produtos agrícolas. Tanto a maçã como o vinho têm períodos de pagamento muito mais alargados. A nível da rentabilidade, eu penso que o sabugueiro é uma cultura rentável, porque basicamente só têm dois picos de trabalho obrigatório: um deles é a poda e outro é a colheita. Sendo que ambos são manuais, não existindo forma alternativa neste momento, à base de maquinaria. Mas a região ainda dispõe de mão de obra disponível, o que permite não ir buscar mão de obra fora da região, a preços incalculáveis, e que ponha em causa a rentabilidade do próprio negócio. E eu acredito também, que nos próximos 3 a 4 anos, o preço pago pela cooperativa aos agricultores, irá subir, o que irá tornar ainda mais rentável, o negócio. Só para dar um exemplo, se tivermos um pomar de sabugueiros, com rega, e com um compasso de 4 por 3 metros, levará cerca de 840 plantas nesse hectare e podemos ter perfeitamente, uma rentabilidade por hectare, entre 8.000 a 10.000 euros, em rendimento bruto. Os custos também não são nada por aí além, o que permitirá a esta cultura, uma margem muito interessante, aos produtores. Mas há muito mais a explorar além das bagas. A flor começa a ter muita procura. A Inovterra tem tido pedidos de vários Países para a flor. No entanto, penso que a produção de sabugueiro tem de aumentar, para se começar a pensar a sério sobre a flor e não prejudicar o negócio existente da baga fresca.
(Continua)
Nota: Entrevista publicada no suplemento Pequenos Frutos 23, que é publicado com a edição impressa da Agrotec 27.
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