Robôs do campo permitem chegar onde o Homem não consegue

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No INESCTEC desenvolve-se tecnologia para facilitar a vida do agricultor. O vinho está na origem de um robô que permite fazer algumas práticas agrícolas nos socalcos do Douro, e um sistema colocado no robô RoMoVi permite fazer análises do metabolismo do fruto.

A paisagem única e encantadora do Douro vinhateiro é rica em desafios, sendo o maior deles a dificuldade em mecanizar alguns processos da cultura. Um terreno em declive, pedregoso e com reduzido espaço de operação, e as altas temperaturas que dificultam o desenvolvimento das máquinas e alfaias agrícolas, tornam o Douro numa região com baixos níveis de mecanização e automação quando comparado com outros contextos agrícolas.

Os vitivinicultores da região há muito que manifestavam a sua vontade de tornar o trabalho mais mecanizado e, em 2014, estes anseios veiculados através da ADVID impulsionaram uma linha de Investigação e Desenvolvimento (I&D) em robótica para vitivinicultura no laboratório de Robótica e IoT (Internet of Things) para a agricultura e floresta do INESCTEC. “Com a ambição de promover o desenvolvimento de soluções robóticas para o contexto de vinhas de encosta e/ou patamares, no INESCTEC propusemos um roteiro de desenvolvimento tecnológico a 10 anos com quatro metas principais, robótica para monitorização, para pulverização de precisão, para poda automática, para colheita seletiva. Tendo por base este roteiro, o INESCTEC convidou, em 2016, a TEKEVER e ADVID a promover um projeto de um robot modular e cooperativo para as vinhas do Douro. Assim surgiu o projeto RoMoVi”, explica Filipe Neves dos Santos, investigador no INESCTEC e responsável pelo projeto.

Aumentar funcionalidades

O RoMoVi inicia-se assim em 2017 e tem a duração de três anos. Estando quase a terminar, Filipe Neves dos Santos explica que “neste momento foram atingidos resultados muito relevantes para esta meta, nomeadamente um sistema de planeamento de trajetórias seguras para robôs e tratores, sistema modular de perceção visual da vinha, sistema de localização robusto a falhas do GPS/GNSS”.

A tecnologia modular desenvolvida permite a reutilização dos diversos módulos do robô em outros contextos. Por exemplo, o sistema de perceção do robô poderá ser retirado do robô e colocado num trator existente, permitindo assim que no decurso da operação deste sejam obtidos mapas de área foliar. O investigador do INESCTEC esclarece que “ser extensível significa alcançar uma plataforma com capacidade de aumentar as suas funcionalidades a qualquer momento com a incorporação de uma nova ferramenta, por exemplo ligar uma mini-motoroçadeira para permitir que o robô durante a realização de uma monitorização da vinha consiga cortar infestantes ou vegetação nas entrelinhas. Ser robusto significa que o desenho mecânico da plataforma teve em consideração a alta pedregosidade do terreno e altas temperaturas existentes nas vinhas do Douro”.

O robot é, assim, fruto de muita investigação e da aplicação de muito conhecimento tecnológico. Por detrás do pequeno aparelho, que pode percorrer os socalcos do Douro, e de qualquer outra região, combatendo, por exemplo, a falta de mão-de-obra que hoje se verifica na agricultura, estão três inovações: uma plataforma móvel com diferentes graus de liberdade e configuração nos eixos de tração com capacidade de controlo de centro de gravidade; tecnologias de perceção visual para diagnóstico da vinha e com capacidade de localização da plataforma mesmo em momentos em que os sistemas de localização por satélite (GPS/GNSS) possam falhar; solução para planeamento de rotas seguras para robô, considerando o modelo 3D do terreno e centro de gravidade do robô.

O RoMoVi é um projeto liderado pela TEKEVER – uma empresa portuguesa, criada em 2001 e dedicada ao desenvolvimento de tecnologia e serviços nas áreas das Tecnologias de Informação e Comunicação, Aeronáutica, Espaço, Defesa e Segurança, que tem capacidade de colocar o robô no mercado. Mas Filipe Neves dos Santos conclui que “o grande desafio passará por encontrar modelos de negócio interessantes, tanto para o comercializador como para o cliente (Agricultores/Vitivinicultores). Ao contrário da comercialização de tratores agrícolas, a comercialização desta tecnologia potencialmente será feita na lógica de serviços onde o robô será uma peça fundamental do prestador de serviços agrícolas”.

O RoMoVi é um projeto de I&D, ao qual se seguirá um processo de validação intensiva da tecnologia, produção e comercialização que poderá demorar até quatro anos.

Metbots, conhecer o estado metabólico da planta

No seio do INESCTEC nasceu mais um sistema, que associado ao robô, permite melhorar o trabalho agrícola. O Metbots foi desenvolvido para obter mais conhecimento sobre o metabolismo da planta, “que é essencial para a existência da agricultura de precisão”, explana Rui Martins, investigador no INESCTEC e responsável pelo projeto.

O Metbots é uma plataforma autónoma que permite automatizar a monitorização metabólica, que conjuga várias tecnologias de navegação e manipulação autónoma, com instrumentação ótica avançada de espectroscopia uv-vis-swnir (ultra-violeta, visível e infravermelho próximo) e LIBS (Laser Induced Breakdown [ver caixa]. O Metbots é capaz de efetuar análise composicional in-situ e em tempo real, assim como, apresentar imagens metabólicas georreferenciadas. Estas imagens metabólicas georreferenciadas são correlacionadas e interpretadas por um sistema avançado de autoaprendizagem baseada em inteligência artificial, que permitirá auxiliar práticas vitícolas precisas. Os resultados podem ser ainda utilizados para efetuar análises da resposta metabólica utilizando modelos da planta à escala genómica (Biologia de Sistemas), por forma a estudar os fluxos entre ciclos bioquímicos de interesse a cada uma das diferentes fases do estado de maturação da uva.

Além destas capacidades, o investigador Rui Martins sublinha que “o potencial disruptivo do Metbots é revelado quando uma grande quantidade de dados (Big Data) de imagens metabólicas e padrões do estado metabólico em sequência temporal são analisadas por inteligência artificial com autoaprendizagem”.

O sistema está a ser desenhado para ser uma ferramenta multidisciplinar para engenheiros agrónomos, enólogos, biólogos e bioquímicos, por forma a trazer as ciências “omics”, geralmente disponíveis em laboratório, para os campos onde a complexidade pode ser registada e estudada.

O sistema já está a ser aplicado no setor do vinho que “é pioneiro no mundo no desenvolvimento e aplicação destas ferramentas. Uma das aplicações mais básicas da tecnologia é a capacidade de seguir a maturação tecnológica (açucares/ácidos) que, quando conjugada com a quantificação de pigmentos e percursores aromáticos de norisoprenóides, permite a seleção de lotes de diferentes qualidades próximo da data de colheita. A pressão de mercado internacional pela disputa de lugares cimeiros na qualidade dos vinhos, leva a que os produtores tenham que implementar sistemas que lhes garantam vantagens competitivas. No contexto de alterações climáticas, existe a urgência de evoluir os procedimentos existentes, passando por gerir a complexidade da produção agrícola utilizando a informação integrada clima-solo-planta associada as técnicas de análise de dados e inteligência artificial com autoaprendizagem”.

A tecnologia Metbots tem como parceiros de investigação o INESCTEC e a ADVID.

A tecnologia do RoMoVi e Metbots

– O RoMoVi é uma plataforma móvel robusta para operar em declives íngremes, capaz de navegar com pouco ou nenhum recurso a GPS/GNSS, utilizando o sistema de visão que permite a navegação nas vinhas, recorrendo à identificação das linhas de vinha por deteção dos troncos das videiras VineSLAM que leva em consideração as características naturais e artificiais dos campos para os mapear e reconhecer a sua localização. Esta plataforma autónoma é capaz de superar valas, rochas e operar em declives (~ 30%). Equipado com câmaras multi-espectrais, pode efetuar o estudo de rendimento de colheita, medir temperatura do solo, ar, humidade; ou ser equipado para efetuar outras operações, como transportar instrumentação avançada e manipuladores.

– O robô Metbots tem um manipulador de cinco graus de liberdade, onde é possível anexar diferentes tipos de ferramentas, nomeadamente o espectrómetro uv-vis-swnir. Dotado de um sistema de perceção visual, o manipulador é capaz de ajustar automaticamente o sensor ao fruto.

– IoT e espectroscopia uv-vis-swnir: sistema desenvolvido no INESCTEC de eletrónica e sistema ótico miniaturizado em configuração patenteada, para registo de espectros e seu cálculo via Internet da Coisas, com registo de dados na cloud.

– Espectroscopia LIBS: sistema em desenvolvimento recorrendo a lasers Nd:Yag e em fibra, sistema de controlo e AI próprios desenvolvidos no INESCTEC.

– Processamento e inteligência artificial: o controlo e análise espectral uv-vis-swnir e LIBS é de significativa complexidade, pelo que são processados por sistemas de inteligência artificial com autoaprendizagem desenvolvidos para o efeito, tomando em consideração os efeitos físicos complexos que ocorrem durante o processo de medição.

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Fonte: Vida Rural

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