A iluminação LED apresenta uma série de vantagens relativamente às tecnologias de iluminação tradicionalmente utilizadas. Consomem menos energia, apresentam uma maior vida útil, permitem a utilização de comprimentos de onda específicos de acordo com o objetivo de produção desejado, permitem um ajustamento mais rigoroso da intensidade luminosa e têm baixa emissão de calor, podendo ser colocadas na proximidade dos tecidos vegetais, inclusive entre as canópias das plantas. Mas será esta técnica economicamente viável? Conheça o trabalho realizado por uma equipa de investigação na Universidade de Évora com várias espécies hortícolas, em ambiente controlado.
A produção de plantas em ambiente controlado, independentemente do nível de controlo, é, desde há muito, utilizada pelos investigadores na área das ciências agrárias e tem permitido uma efetiva transferência de conhecimento para o sector produtivo. Um dos exemplos desta transferência foi o desenvolvimento do conceito de agricultura sem solo (hidroponia).
A evolução destes sistemas de produção conduziu por sua vez ao aparecimento de unidades onde a produção se faz sem solo e sem sol. Na nomenclatura anglo-saxónica este conceito de produção é vulgarmente conhecido por Indoor Farming (IFARM), Controlled Environment Agriculture (CEA) ou Plant Factory With Artificial Light (PFAL) e aqui, parâmetros como temperatura, humidade, concentração de CO2, velocidade do ar, iluminação e nutrição, são rigorosamente controlados. Chamemos-lhe em Português, Agricultura em Ambiente Controlado (AAC).
Porquê LEDs? Porquê Agora?
O aparecimento destas unidades está associado, entre outros fatores, a uma urbanização crescente das sociedades atuais, a menor disponibilidade de terra arável/agricultável, à poluição de recursos como o solo e água e às pressões sociais para a utilização de menos pesticidas.
No entanto produzir plantas em ambiente controlado tem um custo energético muito elevado sendo o custo da utilização da energia para produzir luz artificial e para o controlo ambiental o ponto crítico neste tipo de sistemas.
Depois de algumas tentativas com tecnologias de iluminação menos eficientes, surgiu no Japão, no início deste século, a primeira unidade de produção utilizando LEDs como fonte de iluminação (Mitchell et al, 2015) e na atualidade, só na Asia, já se encontram em funcionamento aproximadamente 450 unidades deste tipo (Newbeancapital,2016).
Figura 1. Estufa com suplemento de luz através réguas de com LEDs vermelhos e azuis para complementar a iluminação natural em Wageningen – Holanda.
A iluminação LED apresenta uma série de vantagens relativamente às tecnologias de iluminação tradicionalmente utilizadas (fluorescentes, vapor de sódio, iodetos metálicos…entre outras); – consomem menos energia, – apresentam uma maior vida útil, – permitem a utilização de comprimentos de onda específicos de acordo com o objetivo de produção desejado, – permitem um ajustamento mais rigoroso da intensidade luminosa (dimming 10-100%), – toda a potência da lâmpada pode ser conseguida instantaneamente, – têm baixa emissão de calor, podendo ser colocadas na proximidade dos tecidos vegetais, inclusive entre as canópias das plantas (Figura 1).
Para além de tudo isso, os LEDs apresentam atualmente um desempenho em termos de eficiência energética (conversão de eletricidade em luz) incomparavelmente superior a qualquer outro tipo de luz.
Os primeiros trabalhos sobre a possibilidade de utilização de LEDs na produção vegetal surgiram no início da década de 90 (Bula et al,1991; Hoenecke et al 1992) e baseavam-se na utilização do único LED então existente, o vermelho (Figura 2A).
Figura 2. Câmaras de ensaio equipadas com LEDs vermelhos (A) LEDs azuis (B) e LEDs brancos (C)
No início dos anos 90 surgiu o LED azul (Figura 2B), trabalho ao qual foi atribuído o prémio Nobel da física e apenas na 2ª metade da década de 90 surgiu o primeiro LED branco (Figura 2C).
Mas, se a iluminação LED tem as vantagens que referimos e se a sua eficiência energética é hoje inegável, a verdade é que a sua utilização na produção vegetal, tanto nas condições em que é a única fonte de luz disponível, com nos casos em que é utilizada como suplemento da luz natural, coloca uma série de novas questões, para as quais, ou ainda não existe resposta, ou a que existe não é consensual.
Será que existem espetros mais adequados para cada espécie, ou para cada etapa do seu desenvolvimento (germinação, crescimento vegetativo, floração)? Será melhor usar misturas de espetros de banda estreita ou um LED branco que satisfaça as necessidades de luz das plantas com o conforto visual de quem trabalha em ambiente controlado pode garantir bons resultados? Em qualquer dos casos, que intensidade luminosa usar? Essa intensidade deve variar com o espetro utilizado?
Como responder a estas questões?
A resposta só pode ser dada com a realização de ensaios comparativos e é neste contexto que a Universidade de Évora a Grow to Green e a Aralab e têm vindo a trabalhar.
Figura 3. Protótipos produzidos pela Aralab e utilizados nos ensaios realizados na Universidade de Évora
Os ensaios levados a cabo na Universidade de Évora têm-se realizado em protótipos desenvolvidos para o efeito pela empresa Aralab (Figura 3), no âmbito do projeto com o acrónimo “LEDing”, financiado pelo programa COMPETE e onde o objetivo foi o desenvolvimento de know-how por parte da empresa com vista a preparar a incorporação da iluminação LED nas suas câmaras climáticas.
Figura 4 – Vista externa de câmaras Aralab em funcionamento no laboratório ISQ.
Já a Grow to Green tem trabalhado no laboratório de eficiência energética do ISQ, (Figura 4), infraestrutura situada em Castelo Branco e financiada pelo programa Mais Centro, QREN e União Europeia, no sentido de otimizar as condições de crescimento em Indoor Farming.
Nos ensaios realizados na Universidade de Évora (Figuras 5 e 6) determinaram-se parâmetros de produção, fotossíntese e relações hídricas, em várias espécies hortícolas, crescendo sob iluminação produzida por lâmpadas fluorescentes (F) que serviram como controlo, e vários tipos de LEDs: branco frio (W), vermelho (R) e azul (B), em intensidades luminosas (PPF) de 70, 120, 250, 340 e 400 µmolm-2s-1.
Figura 5. Ensaio com alfaces em 4 espetros luminosos e 4 intensidades de luz
Dos resultados obtidos, ainda que preliminares, parece poder dizer-se que o PPF utilizado é um fator a ter em conta. Nunca se conseguiu um bom desenvolvimento de qualquer das espécies estudadas com PPFs inferiores a 250 µmolm-2s-1, medidos a 50cm da fonte luminosa. Ora, este é um valor ainda difícil de atingir em condições de produção, com as soluções de LEDs mais económicas atualmente disponíveis. Verificou-se também que, em nenhum caso, os resultados obtidos com a utilização de LEDs brancos foram inferiores aos conseguidos com as lâmpadas fluorescentes (controlo). Este tipo de LEDs parece pois ser capaz de substituir sem limitações a iluminação tradicionalmente utilizada em câmaras de crescimento de plantas.
A utilização de comprimentos de onda específicos, em função de um objetivo determinado, pode ser considerada. Por exemplo, o peso fresco e o número de folhas produzidas foi significativamente superior nas plantas que crescerem sob LEDs vermelhos. Não obstante, a morfologia das folhas foi alterada resultando em pecíolos alongados e enrolamento das mesmas para a página inferior. O teor em clorofilas assim como a acumulação de matéria seca foi favorecida pela utilização de LEDs azuis. Não obstante, o peso fresco foi inferior, assim como o foi o número de folhas produzidas.
Figura 6. Plantas de espinafre, nabo e rabanete sob LEDs brancos (em cima) e sob LEDs vermelhos (em baixo), com uma intensidade luminosa de 340 µmolm-2s-1
Na Grow to Green o trabalho realizado tem incidido sobre a simulação de ciclos de produção em função da utilização de energia (duração, intensidade e espetro) tendo como objetivo maximizar a qualidade e quantidade da produção.
Figura 7. Ensaios da Grow to Green com várias espécies hortícolas e aromáticas
Neste âmbito foram desenvolvidos numerosos ensaios em que se procurou adequar a iluminação a cada espécie e a cada objetivo em particular. Nas espécies já testadas incluem-se diversas cultivares de alface, rúcula, ervas aromáticas, tomateiro, rabanetes, couve, babyleafs…entre outras (Figura 7). De uma forma geral assistiu-se a uma relação direta entre o aumento da iluminação (em intensidade e/ou duração) e a produção de biomassa. Esta produção pode ainda ser amplificada recorrendo ao reforço de fatores de crescimento como o enriquecimento atmosférico com CO2.
Do ponto de vista de características físicas do vegetal, verificou-se que os diferentes espetros induzem respostas distintas nas plantas ensaiadas, nomeadamente ao nível de coloração e textura. Por exemplo, com a variação de intensidade luminosa foi possível produzir plantas verdes e/ou roxas numa mesma cultivar.
Figura 8. Aspeto de uma mesma cultivar de alface quando sujeita a diferentes condições de iluminação
Estes primeiros resultados mostraram que, tanto a intensidade luminosa, como o espetro utilizado tem influência significativa no desenvolvimento das plantas. Que é possível otimizar para cada situação a melhor relação de luz para maximização dos resultados, e que, esta relação deve ser definida em função dos objetivos de produção, podendo ter influência significativa na qualidade do produto final, incluindo-se aqui tanto a componente organolética e nutricional, como a vida útil em pós-colheita.
Todos os ensaios foram efetuados sem recurso a pesticidas ou químicos de qualquer natureza, para além dos adubos líquidos dos sistemas de hidroponia.
CONCLUSÕES
A produção em estufa foi claramente a primeira a beneficiar da utilização da iluminação LED. Pelo seu baixo consumo, os LEDs possibilitaram a suplementação da luz natural alargando significativamente o período de produção, nos casos em que a luz é a limitante. Mas, para além disso, a luz LED relançou o conceito de produção em ambiente controlado. Por todo o mundo antigas unidades fabris desativadas estão a ser transformadas em unidades de produção de plantas, aproximando assim as zonas de produção dos centros de consumo e reduzindo consequentemente a pegada ecológica. Acresce que, com a cada vez maior eficiência dos equipamentos de produção de energia renovável (solar e eólica), a produção nestas unidades caminha a passos largos para a autossuficiência energética. Se a tudo isto adicionarmos a gestão rigorosa do estado hídrico e nutricional das plantas, com a inerente redução do consumo de água e de adubos, e a não utilização de pesticidas, pela ausência de pragas e doenças associadas ao processo produtivo, não será difícil postular que está a preparar-se uma nova (re)evolução na produção agrícola.
Mas muito falta ainda saber sobre o comportamento das plantas a crescer sob LEDs. Na verdade, a possibilidade que temos de avaliar o seu comportamento em comprimentos de onda isolados, começa inclusivamente a por em causa alguns conceitos de fisiologia vegetal que eram até agora inquestionáveis.
Em teoria, será possível produzir qualquer planta em ambiente totalmente controlado, mas, na atualidade, a primazia tem sido dada às hortícolas de folha e às aromáticas. As atuais e futuras perspetivas das capacidades técnicas dos LEDs associadas ao aumento da potência e capacidade de atingir maiores intensidades de luz poderão alargar o número de culturas viáveis. É o caso de culturas hortícolas destinadas à produção de fruto, como o tomateiro ou o morangueiro. Na realidade, será o valor económico de uma cultura que estabelecerá a viabilidade da sua produção.
Referências
Bula, R. J., Morrow, R. C., Tibbitts, T. W., Barta, D. J., Ignatius, R. W., & Martin, T. S. (1991). Light-emitting diodes as a radiation source for plants. HortScience, 26(2), 203-205.
Hoenecke, M. E., Bula, R. J., & Tibbitts, T. W. (1992). Importance of Blue’Photon Levels for Lettuce Seedlings Grown under Red-light-emitting Diodes. HortScience, 27(5), 427-430.
Mitchell, C. A., Dzakovich, M. P., Gomez, C., Lopez, R., Burr, J. F., Hernández, R. & Bourget, C. M. (2015). Light-Emitting Diodes in Horticulture. Horticultural Reviews, 43, 1
Newbean Capital (2016).The rise of Asia´s indoor agriculture industry. White paper Newbean Capital
Autores
- Augusto Peixe, Instituto de Ciências Agrárias e Ambientais Mediterrânicas / Instituto de Investigação e Formação Avançada – ICAAM/IIFA, Universidade de Évora, Ap. 94, 7006-554 Évora, Portugal, apeixe@uevora.pt.
- Hugo Ribeiro, Universidade de Évora-Departamento de Fitotecnia, Ap94, 7006-554 Évora, Portugal.
- João Pereira e Patrícia Pires, Grow to Green – Indoor Farming Solutions, Lda. Zona Industrial de Castelo Branco, Rua D, Lote 122, 6000-997 Castelo Branco, Portugal, info@growtogreen.com.
- Marco Soares, Aralab – Equipamentos de laboratório e eletromecânica geral, Lda. Av. Santa Isabel, Nº 7, 2635-047 Rio de Mouro, Portugal, aralab@aralab.pt.