O sol volta a brilhar na Adega Cooperativa da Vidigueira

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Foi preciso parar para ver, pensar e agora é tempo de agir. No segundo mandato, que irá até 2017, José Miguel Almeida é o rosto da Adega Cooperativa da Vidigueira, Cuba e Alvito que vive um momento de recuperação económica e o número de associados até aumentou. O objetivo é, além de vender maior quantidade, conseguir preços mais elevados.

Uma situação económica difícil é um mal por que passaram e ainda passam muitas cooperativas portuguesas. A Adega Cooperativa da Vidigueira, Cuba e Alvito (Adega Cooperativa da Vidigueira) é uma destas empresas que estão a recuperar.

José Miguel Almeida é, desde 2012, o presidente desta histórica adega alentejana e tem como um dos principais objetivos a regularização dos pagamentos aos associados. A Adega Cooperativa da Vidigueira ainda não tem as contas resolvidas, mas este técnico de agricultura afirma que se está a caminhar nesse sentido.

O gestor preferiu não revelar o total do passivo. Todavia, o montante total é inferior ao volume de vendas previsto para 2016. A fatia maior da dívida é relativa aos associados e estes são prioritários, adianta José Miguel Almeida.

Acertar o exercício económico com o ano agrícola é, para já, uma vontade. Há um plano e a direção pensa que poderá arrepiar caminho, em relação ao estipulado. “Espero, a breve trecho, que em 2017 tenhamos dado passos muito significativos na antecipação do pagamento de tranches aos associados”.

Para este ano, a direção da Adega Cooperativa da Vidigueira espera uma faturação superior aos oito milhões de euros, alcançados em 2015 – em alta de 35% face a 2014, refere José Miguel Almeida. Em 2011, o volume de negócios foi de 4.969.000 euros.

Sinal de que o trabalho está a resultar é o aumento do número de associados, que subiu em cinco. Atualmente são 303 viticultores.

A criação de um departamento de marketing e enoturismo é uma das ferramentas criadas pela atual direção. No campo técnico, João Melícias e José António Fonseca foram contratados como consultores, sendo que a enologia está a cargo de Luís Leão.

A reestruturação ditou o encerramento do departamento comercial, que foi substituído pela Viticale, uma sociedade por quotas, detida a 76% pela Adega Cooperativa da Vidigueira e 24% pela Cooperativa Agrícola da Vidigueira, com a função de promover o aumento das vendas e a valorização dos produtos. Criada em Outubro de 2014, esta empresa tem a cargo as vendas dos vinhos e dos azeites das duas cooperativas.

O enoturismo recebeu impulso, com a atividade a crescer cerca de 5% em 2015 face a 2014. No total, o negócio representou 350.000 euros.

Foco nas marcas

A direção da Adega Cooperativa da Vidigueira decidiu-se por um rebranding total da gama e reposicionamento das marcas. “Focámo-nos nas marcas principais” – afirma José Miguel Almeida. Assim, na base está a Navegante, a meio a Vila dos Gamas e no topo a Vidigueira. No total, são 14 as referências actuais.

“A grande aposta é na marca Vidigueira, que estava muito apagada. Vila dos Gamas era a mais visível”. Agora, os vinhos de gama média e superior passam a ostentar a designação daquela denominação de origem controlada alentejana. Movimento oposto teve a expressão “País das Uvas” – “deixámos cair. Não era representativa e não funcionava”.

José Miguel Almeida, presidente da Adega Cooperativa da Vidigueira

José Miguel Almeida, presidente da Adega Cooperativa da Vidigueira

José Miguel Almeida sublinha que o mercado valoriza a região e premeia bastante a designação Vidigueira. Um activo que não quer desperdiçar. “É um ponto fortíssimo. O aproveitamento começou em 2015 e vai continuar no plano estratégico de comunicação. Já tínhamos percebido essa força, mas só em 2015 percebemos que grande parte do nosso sucesso não era comunicado. Durante décadas não lhe foi dada importância nem houve disciplina de promoção. O efeito é brutal, porque os resultados começaram a aparecer” – adianta José Miguel Almeida.

Um exemplo da reorganização comercial é o regresso das garrafas renanas aos vinhos brancos com Denominação de Origem Controlada Vidigueira. Um modelo que marcou gerações e assinalou o sucesso dos vinhos brancos da região, à base da casta local antão vaz, na década de 60 do século XX.

Outra ideia foi a de atrair os consumidores mais jovens. O argumento é um tradicional licoroso, de fácil agrado e boa conjugação com gelo e limão, para que se possa ser vendido em bares. A marca “Vasquinho” homenageia o primeiro conde de Vidigueira, o navegador Vasco da Gama.

Com a Cooperativa Agrícola da Vidigueira e a Vista Alegre foi criado um conjunto de luxo, composto por vinho de qualidade superior, azeite de topo da cultivar galega e peças de porcelana.

Nem só a Vidigueira faz parte da demarcação nem do âmbito da empresa. José Miguel Almeida afirma que quer aproximar a cooperativa aos agricultores de Cuba e Alvito. Assim, vai aumentar a presença em eventos nesses dois concelhos e provavelmente serão criados produtos identificativos exclusivos, tal como acontece com a Vidigueira, com a marca Vasquinho. “Mas há ainda um largo caminho a percorrer”, afirma o presidente.

Plano de acção com várias frentes

Com os resultados a aparecerem, a direcção decidiu avançar com um investimento encalhado de 3,5 milhões de euros. Este total irá ser aplicado em construção de estruturas que aumentem as áreas de fermentação e de armazenamento de produto acabado. Uma fatia está destinada a uma nova linha de engarrafamento.

A vontade de avançar existe, mas José Miguel Almeida diz-se apreensivo com o andamento do debloquear dos dinheiros públicos. “Temos mesmo de investir. Os pontos estão identificados e temos de avançar”.

Quando a actual direção tomou posse já a Adega Cooperativa da Vidigueira prestava apoio técnico aos associados. Esta valência tem sido alargada e é para aprofundar, garante José Miguel Almeida.

O objetivo é o de ter os técnicos de enologia mais presentes junto dos associados, para poderem decidir, em cima da hora, o momento em que as uvas têm de ser colhidas. Atualmente, é já fornecido aos membros um regulamento com parecer indicando as castas a produzir. Será por essa via que se irão criar as fundações das marcas, segmentando a partir da vinha.

A zona de abrangência da Adega Cooperativa da Vidigueira, coincidente com o território da sub-região Vidigueira, é composta predominantemente por três tipos de solos: graníticos, pardos mediterrânicos e derivados de xisto (pardos de xisto). Em termos de castas, nas brancas reina a antão vaz e, nas tintas, a aragonês.

A reestruturação da Adega Cooperativa da Vidigueira e a reformulação da gama de produtos, com implicações também na designação das marcas, obrigou a Luís Leão “a mexer em tudo”, informa o enólogo.

O desafio a que Luís Leão tem de responder tem dois pontos obrigatórios: sucesso junto do consumidor e manutenção e exploração das características identitárias dos vinhos da sub-região da Vidigueira. Ou seja, garantir quem já hoje escolhe os vinhos da Adega Cooperativa da Vidigueira e cativar quem não conhece as especificidades.

“Acho que a nível do consumidor tem de se apostar no ‘Novo Mundo’. Temos de nos adaptar, mas também adaptar o estilo às nossas características” – afirma Luís Leão. “Sabemos que o consumidor quer fruto qb e que quer vinhos suaves”.

Luís Leão elegeu poucas castas para responder ao desafio. Nas tintas recomenda as alicante bouschet, syrah, touriga franca e touriga nacional. Nas brancas aponta para as antão vaz, arinto e perrum.

O enólogo refere que a duriense touriga franca se está a dar muito bem na sub-região da Vidigueira, onde o chão é alto e arejado. A escolha da alicante bouschet permite dar identidade e potencial de guarda aos vinhos, adianta Luís Leão.

A Vidigueira ganhou fama com os brancos, mas os consumidores preferem tintos. De acordo com José Miguel Almeida, 85% do consumo reporta-se aos tintos. A produção da Adega Cooperativa da Vidigueira tem estado esta, a grosso modo, dividida a meio entre as duas cores. No entanto, no actual ano agrícola as uvas tintas já deverão representar 62%.

Devido a esta preferência, uma parte da produção de branco acaba por ser vendida a granel ou em quantidades menores, a outras empresas que engarrafam com marca própria. Deste universo fazem parte vinhos aptos a poderem ostentar a Denominação de Origem Controlada Alentejo e sub-região da Vidigueira.

Cooperativa não tem de ser um problema

Os consumidores não valorizam a palavra “cooperativa”. Aliás, em Portugal, como noutros países, existe uma carga negativa associada. Para esse facto terão contribuído os anos em que estas empresas não valorizavam a qualidade nem a incentivavam, servindo quase passivamente para a compra das produções dos associados.

Essa realidade levou a que, por exemplo, a Adega Cooperativa de Borba tivesse deixado cair, dos rótulos, a natureza social da empresa, que passou simples Adega de Borba. Na Vidigueira o caminho a seguir será diferente.

Luís Leão - enólogo da Adega Cooperativa da Vidigueira - Vida Rural

Luís Leão, enólogo da Adega Cooperativa da Vidigueira

Embora reconheça que a palavra “cooperativa” possa ser um estigma, José Miguel Almeida pensa que, se for bem aproveitada, por ser um bom argumento de vendas. “Pensemos na diversidade de 303 agricultores e 1.500 hectares de vinha, nos vários microclimas, tipos de solo, modos de manutenção, sistemas de condução. Isso dá-nos uma multiplicidade de soluções para se trabalhar, ano após ano, que outros produtores não têm”.

Em finais de novembro de 2014, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e Cultura) considerou o canto coral alentejano como Património Imaterial da Humanidade. Assim, para celebrar, a Adega Cooperativa da Vidigueira lançou, em 2015, dois vinhos comemorativos. Ambos referentes à colheita de 2014, o branco (antão vaz e arinto) e o tinto (alicante bouschet e trincadeira) foram um sucesso, ao ponto de a empresa ponderar continuar a saudar os cantares.

Igualmente identitário e com decisão mais concreta é a produção de vinho de talha – sistema de vinificação praticado ininterruptamente no Alentejo desde o tempo da ocupação romana. A Adega Cooperativa da Vidigueira comprou dez talhas de barro que deverão permitir, calcula o enólogo, aproveitar cerca de 500 litros de vinho cada. O vinho de talha será certificado como Denominação de Origem Alentejo.

Artigo publicado na edição de janeiro/fevereiro/março de 2016 da revista ENOVITIS

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