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Esta é a segunda campanha da PineFlavour, empresa criada em dezembro de 2016, e cujo objetivo este ano é processar 25 toneladas de pinhão. Isto apesar de ser um ano de contrassafra, cuja produção e qualidade são piores devido também à seca. A empresa quer apostar na qualidade, valorizando o produto no mercado nacional. Mas também na produção biológica, que representa cerca de 20%, e na exportação, principalmente para a Europa.
Na unidade de processamento de pinha e pinhão, na zona industrial ligeira de Grândola, está quase tudo parado. Esta é a altura de “andarmos no campo a angariar matéria-prima, uma vez que a campanha da apanha da pinha decorre de dezembro a março”, explica o sócio-gerente da empresa, responsável pela área de produção.
A PineFlavour é um projeto de três jovens: Miguel Figueiredo (área comercial), Margarida Martins (área financeira) e Pedro Amorim que conta à VIDA RURAL: “Queríamos apostar num negócio sustentável e que promovesse o País”. A mãe tem um doutoramento em Pinheiro manso e apesar de ser engenheiro civil, “sempre tive o bichinho da agronomia”. Aperceberam-se que “cerca de 70% da matéria-prima” existente em Portugal “era exportada para o estrangeiro para ser processada e, por vezes, novamente vendida a Portugal, com valor acrescentado”. Por isso, decidiram apostar.
“O que nos interessa é o pinhão e há muita disparidade no rendimento da pinha, uma pode dar metade dos pinhões de outra, pelo que precisamos de aferir a qualidade global de determinado pinhal para podermos propor o preço.”
A proximidade da matéria-prima (a pinha), “concentrada entre Coruche e Santiago do Cacém”, e do porto de Sines, para as exportações, além do apoio do município, foram “fatores decisivos” na escolha do concelho de Grândola, no distrito de Setúbal, para instalar a unidade fabril, num investimento que rondou 1,5 milhões de euros, diz o responsável pela área de produção da PineFlavour.
Avaliar a qualidade da pinha
“Acabámos em dezembro a produção mais intensiva, de setembro a dezembro. A apanha da pinha decorre agora nesta fase e depois de abril a agosto espalhamos as pinhas na eira para secarem, abrirem e podermos processá-las para retirar o pinhão”, explica-nos Pedro Amorim adiantando que nessa primeira campanha “trabalhámos apenas a 25% da nossa capacidade”, sendo que “este ano queremos processar 25 toneladas de pinhão” aumentando para cerca de 40%. A PineFlavour tem uma capacidade máxima de processar 80 toneladas de pinhão, 500 quilos de miolo de pinhão por dia, devendo atingir a “velocidade cruzeiro” dentro de dois ou três anos. Nesta altura dá emprego a cinco pessoas (os três sócios mais dois colaboradores) mas “esperamos contratar mais duas pessoas já em maio para fazer face ao aumento esperado de produção”, refere.
Miguel Figueiredo, responsável pela área comercial, e Pedro Amorim, responsável pela área de produção da Pine Flavour
Quando visitámos a fábrica, em meados de janeiro, no exterior já estavam alguns montes de pinhas e Pedro Amorim explica-nos que “estamos na fase de avaliar a qualidade da pinha para propormos o preço ao produtor”.
O responsável salienta que “o que nos interessa é o pinhão e há muita disparidade no rendimento da pinha, uma pode dar metade dos pinhões de outra, pelo que precisamos de aferir a qualidade global de determinado pinhal para podermos propor o preço”.
Este processo de avaliação é feito por amostragem aleatória, retirando cerca de 10kg de pinhas que são colocadas numa estufa durante três dias a 70° para secarem (30 a 40% do seu peso é água), abrirem e se poder ver a quantidade de pinhões que têm. Com a indicação desse rendimento médio é feito então o preço.
“Tentamos comprar diretamente ao produtor para garantirmos a origem do produto, porque, normalmente, os intermediários têm pinhas provenientes de várias localizações”, diz-nos Pedro Amorim.
A zona de Pinheiro manso concentra-se entre Coruche e Santiago do Cacém mas em torno de Alcácer do Sal é onde historicamente a qualidade do pinhão é melhor, por estar mais próximo do mar, estando sujeito a menos pragas. Todavia, “tem-se desvirtuado um pouco, embora ainda continue a ter uma qualidade interessante”, refere.
Menos produção e pior qualidade
Miguel Figueiredo junta-se temporariamente à conversa referindo que com 36 amostras colhidas, de quatro fornecedores, podemos dizer que este ano “há menos quantidade e a qualidade da pinha é pior”, pelo que está “cerca de 40% mais cara”, afirma Pedro Amorim. O responsável de produção salienta que este facto de deve à dinâmica da safra e contrassafra, mas também à seca.
A pinha representa 75 a 85% do custo do produto final e “com sorte cerca de 2,5% do peso da pinha é pinhão”, diz adiantando que “a média nacional ronda 2,1%”.
Já o responsável comercial afirma que “fazemos muitas análises também para podermos dar feedback aos produtores e mostrar-lhes que há pinhais com rendimentos médios de 3%”. Desta forma, os sócios da PineFlavour esperam incentivar a cooperação entre produtores para que os menos rentáveis percebam que práticas culturais estão na base de um melhor rendimento. Pedro Amorim salienta que os agricultores que estão ligados a Organizações de Produtores já têm apoio no campo, mas muitos ainda trabalham sozinhos.
O responsável de produção lembra ainda que há um bom trabalho feito ao nível da seleção genética, pela Associação dos Produtores Florestais do Vale do Sado (ANSUB) e pela Associação dos Produtores Florestais do Concelho de Coruche e Limítrofes (APFC) que gerem dois parques de clones (árvores plus) tendo sido selecionados os melhores pinheiros em termos de produção – quantidade e qualidade –, mas também mais resistentes a pragas.
Estas associações fornecem garfos para enxertias bem como sementes destes clones. No entanto, Pedro Amorim refere que “a qualidade da semente de um pinhal novo não é muito relevante porque como tem sempre de se fazer enxertia aos 4/5 anos, aí é que é fundamental que os garfos sejam provenientes de árvores de excelência, de preferência destes dois parques”.
Produção e procura biológica crescem
Miguel Figueiredo diz-nos que “o nosso produto tem tido muito boa aceitação, principalmente no segmento biológico, onde conseguimos estar presentes nas maiores lojas, como o Miosótis e a BioFrade” e adianta: ”O consumidor bio é tipicamente um consumidor mais informado e até agora não havia opção de produto embalado biológico nacional de qualidade, sendo a maioria produto espanhol”.
Pedro Amorim acrescenta que o pinhão proveniente de produção biológica representa cerca de 20% das vendas da empresa, “valor que pensamos manter com o crescimento que temos previsto”.
O responsável comercial salienta, por seu lado, que “a nossa imagem veio diferenciar-se no mercado, por ser um produto premium”. Destaca que “por sermos uma empresa pequena e nova somos mais flexíveis e dá como exemplo uma das embalagens: as caixas, que foram requisito de um cliente”, salientando que são feitas em Portugal. Os sacos ainda não são “porque não tínhamos encontrado o que queríamos mas já encontrámos e estamos dispostos a investir de novo para mudar para um fornecedor nacional” e frisa: “o preço final do miolo de pinhão também depende da embalagem”.
Exportação prevista é de 50%
No mercado nacional, a PineFlavour vende com marca própria para o El Corte Inglés e os supermercados de produtos biológicos e também para cadeias de vários países europeus, como Reino Unido, França e Eslovénia, sendo que cerca de “metade da produção de pinhão” prevista é destinada à exportação.
Em Portugal, cerca de 85% da produção é vendida para empresas que embalam e vendem diversos frutos secos com a sua marca.
No final do processo de transformação na unidade da PineFlavour, o miolo de pinhão é separado em duas categorias, A e B, de acordo com a qualidade. A Categoria A (de elevada qualidade) é vendida para a distribuição – cadeias, empresas embaladoras, etc. enquanto o produto de Categoria B (pinhão mais amarelado ou partido) segue para a indústria, nomeadamente de pastelaria.
A empresa comercializa o produto em sacos de 20kg (principalmente para a indústria) e de 1kg (dirigidas, por exemplo, à Makro) e em embalagens de 50, 100 e 150gr, com marca própria, para a grande distribuição.
Colheita é maioritariamente manual
Por lei, a colheita de pinhas de Pinheiro manso só é permitida de 15 de dezembro a 31 de março para impedir a apanha ilegal de pinhas antes do seu completo amadurecimento, assegurando assim a qualidade do produto bem como a colheita do ano seguinte.
O responsável da área de produção da empresa de Grândola explica que a colheita da pinha é maioritariamente manual precisamente porque os vibradores que existem no mercado ainda não estão perfeitamente adaptados uma vez que tem de se ajustar o tempo e frequência de vibração para que não comprometa a produção dos dois anos seguintes “uma vez que na árvore coexistem as pinhas deste ano, já prontas a apanhar, com as do próximo e as do ano seguinte, que estão já em formação”, adiantando que estão em curso vários estudos, “como um da Universidade de Évora com o qual estamos a colaborar” para definir melhor a forma de calibrar estes equipamentos que ‘abraçam’ a árvore, para medirem o seu diâmetro, e assim, com um sensor avaliar a frequência de vibração e durante quanto tempo.
Os apanhadores prendem escadas aos troncos da árvore e lá do alto (as árvores podem atingir os 15 a 18mt) veem melhor todas as pinhas e tocam-lhes com uma vara – com uma ponteira ou gancho – para que as pinhas caiam no chão, sendo depois recolhidas.
Da pinha ao pinhão
Quanto as pinhas chegam à PineFlavour são pesadas na balança e depois separadas por lotes segundo a origem e tipo (separando a produção biológica). No verão são depois espalhadas na eira e ao fim de cinco a sete dias, depois de abertas é separado o pinhão negro (com casca) da pinha num tambor que consegue retirar cerca de 70% dos pinhões, sendo as pinhas encaminhadas de seguida para um descascador, depois para um triturador e numa peneira sai o pinhão limpo.
“O consumidor ‘bio’ é, tipicamente, um consumidor mais informado e, até agora, não havia opção de produto embalado biológico nacional de qualidade, sendo a maioria produto espanhol.”
Além do fruto, o processo utilizado na PineFlavour permite aproveitar as cascas do pinhão e a própria pinha, que será vendida “essencialmente para fábricas de pellets ou para padarias e aviários” para ser usada como combustível. “Estas cascas têm um poder calorífico superior à madeira e acabam por ser apetecíveis para esse tipo de indústrias”, esclarece Pedro Amorim.
O pinhão negro é colocado em big bags de 1000kg e para o início do descasque é colocado num tegão dentro de água durante cerca de 10 horas “para o miolo ficar com mais humidade e aguentar as fases seguintes sem se partir”. Depois descansa cerca de 12 horas e passa para um secador de ar quente onde sofre um choque térmico a cerca de 65°, alimentado por uma caldeira a gás. “Este choque é para provocar uma fissura na casca do pinhão”, explica o responsável, para que depois se parta quando o pinhão é disparado por um ventilador contra uma parede de aço.
Lavado, seco e escovado
O miolo é separado grosseiramente da casca e vai numa peneira para três bocas: para uma segue o pinhão que não se partiu para ser disparado novamente, noutra sai a casca e na terceira o pinhão (ainda com alguma casca e pele), que é separado por tamanho. Segue posteriormente para um separador a ar que retira os restos de casca e as peles. O miolo de pinhão vai depois para um jacuzzi (um lavador que tem ume rede de sprinklers) de água fria e segue para um secador onde a temperatura é superior a 75° “para matar todas as bactérias que possam existir e coloca o miolo com o nível de humidade natural, isto é cerca de 4,5%”. Por último passa por uma refrigeradora e é escovado “para lhe dar brilho”. É colocado em caixas especiais de esferovite e colocado na câmara frigorífica a 10°, sendo embalado depois de acordo com as encomendas.
A unidade fabril da PineFlavour tem 624 metros quadrados e foi construída com preocupações “ambientais e de consumo”, como “o aproveitamento de águas pluviais ou a iluminação led”. Além da área fabril de processamento da matéria-prima, a unidade está equipada com um laboratório para analisar o produto.
Quebra de produção de 25%
A campanha de apanha da pinha decorre de 15 de dezembro a 31 de março, como referimos no texto em cima. A análise do SIMA – Sistema de Informação de Mercados Agrícolas, sobre fruticultura, referente à semana de 11 a 17 de dezembro dizia: “Prevê-se um ano com pouca produção e colheita de pinha. A produção de pinha é bastante inferior à do ano passado”.
Já este ano, a análise da semana de 08 a 14 de janeiro, atestava: “Confirma-se a previsão inicial de uma quebra acentuada da pinha em relação ao ano passado, em cerca de 25%”, salientando que “a apanha vai a meio” e que há uma “procura alta” de pinhão.
As transações da pinha situam-se entre os 0,90€ e 1,00€/kg. Geralmente convenciona-se que quatro pinhas equivalem a 1 kg.