–
Vamos lá falar de biodinâmica. Sem medo. Sim, há quem considere este modo de produção mais do domínio da filosofia do que da agronomia, mas a verdade é que há cada vez mais produtores assumidamente a fazer a transição para esta prática alternativa que vai para além do modo biológico. Gerard Bertrand é um produtor de vinho francês que acredita que não é possível produzir sem respeito pelo ecossistema e pelo equilíbrio entre a natureza e o ser humano. E transpôs essa crença para um grupo empresarial que gere atualmente perto de 1000 hectares de vinhas no sul de França, todas biodinâmicas. Provavelmente já ouviu falar, ou bebeu vinho, de algumas destas marcas: Cigalus, Aigle Estate, Clos du Temple, Château La Sauvageonne, Château l’Hospitalet, Château des Karantes, Château Tarailhan, Château Aigues Vives, Château des Deux Rocs ou Château de la Soujeole. Volto a frisar, são 1000 hectares certificados e controlados como biodinâmicos.
“É preciso ter humildade para perceber que a natureza é mais forte que nós”, alertou na sua apresentação durante a manhã do segundo dia de conferências do Climate Change Leadership. E os resultados deste investimento são visíveis no aumento da qualidade dos vinhos: mais mineralidade, frescura e ainda capacidade de envelhecimento.
A prática da agrofloresta (base da agricultura sintrópica) e os equipamentos elétricos fazem parte do dia das explorações que gere. Mas também o conhecimento e a procura de diversidade: “Existem 7.000 castas de vinha mas o consumidor só conhece cerca de 10! isto é lamentável”, aponta Bertrand.
A 6ª extinção em massa
Do Chile, Olga Barbosa, especialista em conservação, trouxe o alerta para a vulnerabilidade das regiões mediterrânicas mas também a certeza que o setor do vinho tem uma oportunidade gigante para fazer a mudança. Mas foi muito realista quanto ao fulcro da questão: não estamos a falar apenas de alterações climáticas, “estamos a falar da sexta extinção em massa deste planeta”.
Olga Barbosa insiste que as decisões dos empresários agrícolas importam, e muito. Afinal, 40% das emissões de gases com efeito de estufa provêm da agricultura. E se queremos continuar a comer é crítico proteger a biodiversidade: “neste momento observamos perda de floresta, perda de terra e perda de insetos”. E em resultado disto, há menos captura de CO2, maiores riscos de inundações e disrupção no ciclo de nutrientes. A questão repete-se: Podemos mudar alguma coisa a tempo? No Chile o trabalho já começou e foi iniciado um programa para tornar compatíveis a produção de vinho e a conservação da biodiversidade. A resposta está na gestão dos ecossistemas e a ciência pode dar uma ajuda importante na tomada de decisões e na conciliação de visões distintas.
Mas, o que é que está a ser feito? Pequenas boas práticas que garantem bons resultados, como a definição de áreas de proteção nas vinhas, controlo de espécies exóticas invasoras, desenvolvimento de espécies nativas para combater pragas e prevenir a expansão das invasoras. E, muito importante, avaliar a eficiência e partilhar este conhecimento. Em resumo: “Aprender fazendo”. As práticas sustentáveis fazem agora parte do quotidiano e de um Código Nacional de Sustentabilidade do qual todos querem fazer parte. Olga Barbosa resume bem o espírito: “Se temos a ciência do nosso lado, podemos atuar agora!”.
Não há reparações rápidas
Heinrich Scholms, especialista em solo da Vinpro, associação que representa mais de 2500 produtores sul-africanos, começou a sua intervenção com um apelo realista: ”Todos queremos reparações rápidas. Mas isso não é possível, é preciso começar a criar raízes”.
Scholms acredita que escolher o melhor local para plantar a vinha pode ser a mais importante decisão de um viticultor: altitude, inclinação, curvatura, radiação solar, horas de sombra, hidrologia, distância de cursos de água, tudo conta nesta equação.
A rega é um tópico sensível. Temos a certeza que estamos a regar da maneira certa? Para este cientista dos solos está certo aquilo que dizem os defensores da não rega: vinhas com raízes mais profundas precisam de menos água. Por isso, salientando que a rega é necessária na maioria dos casos, deve-se adiar a primeira irrigação da vinha o máximo possível: “uma irrigação prematura leva ao desenvolvimento de raízes mais fracas”, avisa. A técnica é regar durante mais tempo, mas de forma irregular e abandonar as regas frequentes e curtas.
Mas nem só a rega precisa de regras rígidas. A fertilização é outros dos pontos sensíveis para Scholms, que não morre de amores pelo nitrogénio, um elemento que na sua opinião debilita o solo e mata fungos benéficos na terra. O mulching é uma técnica aconselhada para proteger e regenerar solos, com vantagens óbvias: reflete a radiação solar, mantem o solo fresco, previne a erosão, aumenta a infiltração de água e protege das ervas.